4. Os currículos e as experiências de espaços precarizados

Vivências da pobreza e do trabalho infantil

Uma experiência marcante das vivências da pobreza é o trabalho prematuro. Percebemos que milhões de crianças e adolescentes tentam conciliar o tempo dedicado ao trabalho e ao estudo escolar. Sendo assim, observamos que a estreita relação entre pobreza e trabalho gera um forte impacto na realidade pessoal e familiar desses sujeitos.

Trabalho infantil

O trabalho infantil é um problema vasto e complexo, que tem diversas causas e encontra fortes barreiras culturais à sua erradicação. No Brasil, o estado de Santa Catarina é um dos que têm os maiores índices desse tipo de exploração. Este vídeo revela um pouco sobre a realidade do trabalho infantil no estado, as ações para eliminá-lo e os empecilhos enfrentados no combate ao problema.

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Não é brinquedo. Direção de Daniele Rodrigues (2014).

Somando-se a essa reflexão, um artigo de Maria de Fátima Pereira Alberto e outros autores (2009) aborda uma das facetas mais invisibilizadas do trabalho infantil: o trabalho doméstico. Nesse caso, o estudo analisa dados do município de João Pessoa, na Paraíba. Clique aqui para lê-lo.

A maioria das crianças e adolescentes pobres é obrigada a alguma forma de trabalho para sobreviver, para ajudar a família. No caso das meninas, muitas vezes a jornada de trabalho é dupla, ou seja, tanto saem para trabalhar como realizam os afazeres em casa. É preciso observar se essa realidade de trabalho de crianças e adolescentes pobres tem estado presente ou ausente nos currículos, nos conhecimentos recebidos por eles(as) nas escolas. Pesquisar a existência dessa realidade em coletivos de mestres e estudantes seria uma forma de aproximar a relação entre pobreza e trabalho dos conhecimentos curriculares. Essas são questões a serem levantadas na formação de pedagogos(as) e licenciados(as).

Outra forma de aproximar currículo, pobreza e trabalho infantil seria reconhecer que a garantia de dados e análises sobre o trabalho – e, especificamente, sobre o trabalho infantil, adolescente e juvenil – é um direito dos(as) alunos(as) trabalhadores(as), que engloba todo o conhecimento produzido nas diversas áreas do currículo. O trabalho, incluindo o infantojuvenil, e sua relação com a pobreza têm merecido estudos fartos sobre as causas dessa realidade histórica tão constante a que milhões de pobres são condenados.

Recentes estudos do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) têm mostrado que, com a crise econômica recente, milhões de latino-americanos, africanos e até europeus passaram a figurar abaixo da linha da pobreza em razão dos altos índices de desemprego. Isso significa a globalização da pobreza pela crise econômica globalizada. Pesquisar tais dados e análises nas escolas e relacioná-los com a pobreza e as crises da economia e do trabalho é uma forma de aproximar currículo e pobreza. Assim,  amplia-se o círculo fechado das disciplinas, permitindo uma abertura a conhecimentos já produzidos e acumulados sobre vivências tão extremas dos(as) próprios(as) alunos(as)-trabalhadores(as).

 

Alguns coletivos docentes têm levantado debates em dias de estudo com os(as) estudantes-trabalhadores(as) sobre como veem (e se veem nessas) representações do trabalho infantil tão destacadas na mídia e em programas e políticas sociais que o combatem. Tais levantamentos podem ser feitos através de depoimentos e redações de histórias de vida, de trabalho infantojuvenil em casa, na agricultura, nas ruas e em tantas formas de trabalho de sobrevivência. A partir dessas narrativas, pode-se discutir por que trabalham, como se veem no trabalho e na condição de alunos(as)-trabalhadores(as). É necessário aprofundar reflexões a esse respeito através de textos, análises que deveriam fazer parte dos conhecimentos das diversas áreas dos currículos e do material didático.

Na obra Trabalho-Infância (ARROYO; SILVA, 2014) podem ser encontrados dados e análises sobre a relação tão estreita e tensa entre trabalho, pobreza e infância, aspectos a serem discutidos em dias de estudo como: infância-pobreza e sobrevivência do próprio trabalho; pobreza e o caráter provisório do trabalho; o trabalho infantil como saída de emergência para a pobreza; o trabalho infantil e o aprendizado da condição de pobre, de classe trabalhadora; a determinação social da pobreza e do trabalho; a matriz social humanizadora do trabalho; a infância repõe na cena pedagógica a pobreza e o trabalho...

Essas e outras dimensões da relação entre currículo, pobreza e trabalho infantojuvenil aparecem nas narrativas dos educandos(as) e das suas famílias e coletivos sociais. Dar destaque a essas temáticas nos currículos será um caminho para aproximar pobreza e trabalho nos cursos de formação de docentes-educadores e da Educação Básica; uma forma concreta de garantir o direito de todos(as) os(as) alunos(as) e, especificamente, das infâncias-adolescências pobres-trabalhadoras ao conhecimento devido como cidadãos(ãs).