3. As gerações de direitos humanos

Podemos falar em gerações de direitos humanos? Como já vimos, a historicidade dos direitos humanos é uma de suas características doutrinárias. Além disso, a evolução histórica desses direitos, tratada na primeira unidade deste módulo, permite-nos compreender que os momentos vividos pela humanidade na busca de direitos constituem etapas em que eles vão sendo conquistados, reconhecidos, garantidos e usufruídos. Os direitos humanos são, assim, uma lenta conquista. Por serem históricos, são suscetíveis a mudanças, alteráveis e passíveis de ampliação. É essa natureza dos direitos humanos que nos permite analisar a sua evolução a partir da ideia de etapas, gerações ou dimensões.

Essa não é uma proposta consensual. Ao lado de estudiosos(as) dos direitos humanos que defendem a existência de gerações evolutivas estão aqueles(as) que consideram que essa aplicação dificulta a compreensão de um processo dinâmico e progressivo de transformação. Nesse sentido, adotaremos de forma crítica a ideia de gerações dos direitos humanos, com as ressalvas que julgarmos oportunas e com fins puramente didáticos, que permitam identificar a construção dos direitos humanos no contexto histórico em que nasceram, conforme o movimento das necessidades humanas em cada época e circunstância.

A primeira referência à ideia de gerações de direitos humanos foi feita por Karel Vasak, no âmbito de um curso realizado pelo Instituto Internacional dos Direitos do Homem, em Estrasburgo, França, em 1979, para tratar da evolução dos direitos humanos utilizando como parâmetro de sua reflexão a tríade de valores da Revolução Francesa, liberdade, igualdade e fraternidade. Assim, a evolução dos direitos humanos ocorreria em três gerações, cada uma delas ligada a um desses valores. Num primeiro momento, estariam os direitos de primeira geração, tendo como referência o valor da liberdade, na forma de direitos civis e políticos como a liberdade política, a liberdade de expressão, a liberdade religiosa, dentre outras, todas consideradas direitos do indivíduo. Num segundo momento, viriam os direitos de segunda geração, ligados ao valor da igualdade, expressos em direitos econômicos, sociais e culturais, cuja titularidade não é apenas do indivíduo, mas de uma determinada coletividade. Num terceiro momento, estariam os direitos de terceira geração, relacionados ao valor de fraternidade, concretizados por meio dos direitos ao desenvolvimento, ao meio ambiente equilibrado, à conquista da paz e, por isso, voltados a toda humanidade.

Entendemos que uma geração não substitui outra, mas ambas se acumulam, de forma que os direitos da geração precedente não desaparecem quando surgem os direitos de uma nova geração. Somente assim podemos admitir a metáfora das gerações para explicar a evolução dos direitos humanos. Por isso, talvez seja mais apropriado falar em dimensões dos direitos humanos, não compreendendo qualquer hierarquia entre eles, sem valorizar mais uma geração do que outra, em função da natureza da indivisibilidade que já vimos ser parte intrínseca desses direitos. Mas é inegável que novos direitos vão surgindo em função da dinâmica histórica, do nível de organização da sociedade em torno de lutas específicas e da consciência dos seres humanos como sujeitos de direitos. 

Da mesma maneira, os novos direitos não nascem do nada, como se brotassem espontaneamente. Assim como os velhos direitos não desaparecem em função da conquista de novos direitos, é forçoso reconhecer que o novo também nasce do velho, como num processo de expansão contínua, tendo em vista o avanço do processo civilizatório. Os novos direitos vão aportando, imbricados aos direitos já conquistados, constituindo uma nova síntese que corresponde também ao nível de complexidade social em que surgem.

Guardadas essas ressalvas, analisemos o percurso histórico dessas gerações, etapas ou dimensões dos direitos humanos.